sexta-feira, 10 de abril de 2015

Luiz Argôlo usou própria mãe como laranja, diz Procuradoria




Helicóptero, maquinário pesado, dinheiro vivo, óculos, cadeiras de rodas e até boletos do IPTU de um dos imóveis do então deputado Luiz Argôlo (ex-PP, atual Solidariedade-BA) foram pagos pelo doleiro Alberto Youssef, afirma a Polícia Federal.

Preso na manhã desta sexta-feira (10) em nova fase da Operação Lava Jato, Argôlo usou a própria mãe como laranja e o pai para receber dinheiro do operador da propina na Petrobras.

Considerado por Youssef como um "deputado promissor de quem um dia poderia cobrar a conta", o jovem baiano (34 anos) passou a ser um interlocutor frequente do doleiro. O montante dos valores repassados ao então congressista em dinheiro vivo ainda é desconhecido - variava entre R$ 20 mil e 200 mil mensais, conforme a proximidade do período eleitoral e vinha das propinas de empreiteiras por obras na Petrobras, segundo a delação de Alberto Youssef.

Argôlo chegou a usar o cargo de deputado para tentar conseguir um financiamento para que Youssef reformasse um hotel de sua propriedade, em Porto Seguro (BA). A conclusão dos procuradores é que o ex-deputado "efetivamente vendeu seu mandato parlamentar" ao doleiro.

Algumas vezes, o suborno era entregue no apartamento 603, do bloco H, na 302 Norte, o apartamento funcional de Argôlo, na capital federal.

Fora os pagamentos em cash, a Procuradoria rastreou pelo menos R$ 2,68 milhões referentes a supostas propinas embolsadas por Argôlo entre 2011, início do seu mandato de deputado federal, e março de 2014, quando foi deflagrada a Lava Jato.

O dinheiro fluía através de camadas de empresas de fachadas, operadas por laranjas ou mesmo com o pagamento de dívidas do congressista diretamente pelos empregados de Youssef.

A Folha ainda não localizou o advogado de Argôlo.

'É BOM ESTAR À DISPOSIÇÃO'

Na denúncia da Procuradoria, é mencionada a aproximação entre Argôlo e executivos da OAS e UTC, integrantes do cartel de empreiteiras.

Em março de 2014, uma semana antes da deflagração da Lava Jato, Youssef envia a Argôlo uma mensagem de celular: "Falei com matheus vai liberar semana que vem. Uma parte dos 400".

Para os procuradores, trata-se de Matheus Coutinho de Sá Oliveira, diretor financeiro da OAS, e a conversa gira a respeito de uma parte do pagamento de uma propina de R$ 400 mil.

Em uma outra troca de mensagens, Argôlo pergunta ao doleiro: "Vc acha q eu devo ir lá na casa de RP?". RP, na interpretação dos procuradores, é Ricardo Pessoa, presidente da UTC.

"Eu acho que sim vai dar um abraço nele pessoalmente. Sempre é bom escutar e se colocar à disposição", aconselha Youssef.

MAQUINÁRIO PESADO

Em 2013, o ex-deputado conseguiu negociar a locação de maquinário pesado para uma obra tocada pelo consórcio MGT na Bahia. Como não tinha os equipamentos que ofereceu, Argôlo recorreu a Youssef que, em fevereiro de 2013, deu um sinal de R$ 520 mil pelos contratos de locação com opção de compra de uma escavadeira Doosan S340 (R$ 680.156,44) e dois tratores compactadores Bomag (R$ 280.484,00 cada).

Como a operação foi feita pela Malga Engenharia, controlada por Youssef e da qual Argôlo seria sócio-oculto, não haveria ligação de Argôlo com o negócio, não fossem os detalhes escondidos em cláusulas dos contratos. O próprio congressista figurava como fiador da opção de compras das máquinas. Vera Lúcia de Barros Correia, a mãe do ex-deputado, aparece como a "fiel depositária" da escavadeira e dos tratores.

No mesmo ano, o pai dele, Manoelito Argôlo, recebeu um depósito de R$ 60 mil feito pela contadora de Youssef, Meire Poza. A justificativa do depósito é a suposta venda de um terreno de 111 mil m2 do ex-deputado ao doleiro. Os R$ 47 mil restantes da transação foram pagos por Poza a Élia dos Santos Hora, uma espécie de braço-direito de Argôlo no seu escritório político em Salvador.

O uso de laranjas e empresas de fachada na venda do terreno levantou a suspeita entre os investigadores de que a transação foi apenas um disfarce para pagamento de propina com dinheiro desviado com o superfaturamento de obras de empreiteiras na Petrobras.

Apontada pela Procuradoria como a "gerente dos negócios escusos" de Argôlo, Élia Hora também foi presa nesta sexta. Entre 2011 e 2014, pela conta bancária de Meire circularam R$ 757 mil que foram sacados em dinheiro vivo para serem repassados ao político.

IPTU E CADEIRAS DE RODAS

Um dos símbolos da Lava Jato foi a apreensão de um helicóptero Robinson R44, azul. Como a Folha revelou em setembro do ano passado, a aeronave foi dada de presente por Youssef a Argôlo. Na fase da operação deflagrada na manhã desta sexta, vieram à tona detalhes da operação: em 2012, o político pagou somente a entrada de R$ 250 mil e Youssef bancou os R$ 600 mil restantes.

O doleiro pagava despesas prosaicas do deputado, como o IPTU de um imóvel de Argôlo em Camaçari, na região metropolitana de Salvador. Numa troca de e-mails de fevereiro de 2013, uma empregada de Argolo reclama a um dos funcionários de Youssef que "a primeira parcela ainda está em aberto" e, no anexo da mensagem, o boleto com o código de barras.

Em 20 de setembro de 2013, o congressista enviou uma mensagem em seu Blackberry pedindo a que Youssef pagasse a metade de uma dívida que tinha com a compra de óculos e cadeiras de rodas de uma empresa chamada Multimed, em Alagoinhas, base eleitoral do então deputado.

Os Argôlo são uma família tradicional da política do norte da Bahia. Em 2000, seu pai, Manoelito, foi eleito prefeito da pequena Entre Rios e Luiz estreou na política como o vereador mais votado do município. Na vizinha Cardeal da Silva Manoelito Argolo Júnior conquistou a prefeitura no mesmo ano.

Luiz Argôlo foi eleito deputado estadual em 2002 e 2006 e deputado federal em 2010. A distribuição de cadeiras de rodas, óculos e remédios para eleitores, segundo a Folha apurou, é uma prática corriqueira na região. A partir de 2011, já instalado em Brasília, o herdeiro político dos Argôlo aproximou-se do operador do petrolão.

Em 24 de setembro de 2013, quatro dias depois do pedido do deputado, Youssef mandou depositar R$ 21.500 na conta da empresa que fornecia cadeiras de rodas.

Folha de São Paulo

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